mercredi 21 janvier 2009

bom dia, ela diria (era um lindo dia!), entre os anêmicos bambus que brotavam de vasos quadrados, tristonhos. o tecido azul do céu parecia encardido, de tantas lágrimas contidas; mas ela ainda diria que era um lindo dia. oh, aquela musa neotropicalista, evocando bananas e pêras e nomes de escritores difíceis, lentos, que falavam sobre róseas conchas que se erguiam como agulhas, em sua plissagem demoníaca e doce; e sobre a fenda do pêssego; e sobre noites azules onde as matrioshkas nevavam, desfazendo-se.

alguém lhe disse: que cara é essa?

foi como levar um chute na traquéia. detestava horrivelmente que tivesse de justificar-se diante daqueles que nem ao menos compreendiam a envergadura de suas asas imensas, que nada sabiam sobre bananas e pêras, sobre a cor melancólica das penas dos corvos, sobre os mortos que ressucitavam, em pedaços, vestindo trajes de tule azul-esmirna. não. sentia o coração murchando ao ter de trair-se de maneira tão inevitável, engolindo todos os peixes lilases e dizendo: nenhuma, não é nada. pois se ela ousasse dizer a eles sobre tudo aquilo que havia dentro de si, oh, eles se revoltariam, atirariam-lhe pedras desdenhosas, aqueles malditos. se pudesse, os trancaria no picadeiro de um circo e ataria fogo à lona colorida. acenderia um cigarro e se sentaria na calçada, entre bailarinas inexpressivas e pipoqueiros, observando-os serem carbonizados um a um, transformando cada grito tétrico em uma nota musical que flutuaria com as chamas, perfurando as mais baixas membranas celestes. era o que eles mereciam, por não deixá-la ser.

(mas --
mas uma madame mariposa que por ali passava pousou-lhe no ombro e sussurrou-lhe mil asas de andorinha.)

um grito morreu na garganta prateada. a duas colinas dali, um balão subia até o além-termosfera. "ousarias?" sim -- por supuesto. então ela caminhou do infravermelho, passando pelo amarelo, até o ultravioleta. jamais deixaria que a esmagassem com interrogações novamente.

Aucun commentaire:

Archives du blog